A saúde oral entrou pela primeira vez como prioridade assumida pelo Governo no relatório do Orçamento de Estado para 2008 (OE2008), mas ainda fica aquém das propostas elaboradas pelo grupo de trabalho nomeado por Correia de Campos para elaborar os caminhos de uma política para o sector. Num país sem oferta pública de medicina dentária e onde cerca de metade da população não tem acesso a ela por manifesta falta de poder de compra, a inserção do tema no orçamento é recebida como positiva pela Ordem dos Médicos Dentistas (OMD).
O relatório do OE2008 limita-se a adiantar a saúde oral como "domínio prioritário, especialmente focalizado na prevenção da doença de modo a que alguns segmentos da população, em particular crianças, grávidas e idosos com baixos rendimentos, possam ter dentes saudáveis". Quanto a ideias concretas, o ministro fecha-se em copas até à discussão do documento na especialidade.
Recomendações
Certo é que esta pequena declaração de intenções não acata todas as recomendações do grupo de trabalho, que Correia de Campos já tem na sua secretária desde Junho. Os peritos sugerem a oferta de cuidados a mais grupos, nomeadamente diabéticos.
Quanto a propostas para a forma de oferecer estes cuidados à população através do Serviço Nacional de Saúde, o JN sabe que estão em cima da mesa sugestões para convenções com consultórios privados, à semelhança da experiência britânica, bem como de contratação de médicos dentistas para os centros de saúde. Até porque muitos dispõem de equipamento, que está às moscas por falta de profissionais há 15 estomatologistas nos quadros do SNS. O cenário é tanto mais caricato que Portugal conta actualmente com um médico dentista por cada 2048 habitantes, o que coloca o país no sétimo lugar do ranking europeu, um "excesso" no entender da OMD.
Uma das sugestões já apresentadas ao ministro vai no sentido de se criar um "cheque tratamento" a todos os elementos de um segmento populacional prioritário, que poderiam com ele dirigir-se a qualquer médico dentista para tratar os dentes. Um pouco à semelhança dos vales-cirurgia que o Estado oferece a utentes em lista de espera para além do tempo médico razoável.
Até se fazer luz sobre as intenções do Governo, a oferta pública de cuidados de saúde oral limita-se ao programa nacional dirigido a crianças e adolescentes. Mas funciona por cotas atribuídas a cada sub-região de saúde e abrange apenas, segundo o bastonário da OMD, Orlando Monteiro da Silva, 45 mil do milhão de crianças do país. Sobra a carolice de algumas sub-regiões de saúde e de alguns centros de saúde para aproveitar todas as alíneas da lei e conseguir ter médicos dentistas.
Em Inglaterra, diz, toda a gente tem acesso à saúde oral, com diferentes níveis de co-pagamento em função do rendimento. E, em Espanha, todas as crianças têm cuidados gratuitos até aos 18 anos, idade a partir da qual se entende que a prevenção é responsabilidade individual. "Vamos aguardar pelo debate na especialidade, para ver se há ovos para fazer a omelete".
Fonte: Jornal de Notícias
21/10/2007